Uma estória
Só me dão sopa
Meninos e meninas das minhas idades, deles guardo a sensação
de que a maioria conseguiu adaptar-se ao nosso estilo de vida. Outros, nem por
isso.
Quando as famílias que os receberam se situavam a um nível
social médio, com filhos ou familiares das mesmas idades, era notória a alegria
das crianças: brincavam, riam e folgavam com naturalidade; outras, em famílias
sem filhos e sem crianças por perto, mostravam-se naturalmente mais reservadas.
Procuravam, quando podiam, as suas compatriotas para conversarem e conviverem.
Nenhuma, que me lembre, falava português, mas iam-se adaptando e descobrindo as
nossas palavras e expressões.
Algumas começaram a encontrar-se em casas de famílias com
melhores condições de acolhimento e então era agradável ver a satisfação com
que passavam o dia. Ali comiam e se divertiam.
Depois começaram a querer ficar mais tempo até que um dia
assisti a uma cena triste. A criança recusava-se a regressar à família de
acolhimento. Entre choros e lágrimas, agarrada à senhora que havia acolhido uma
sua amiga, justificava a sua recusa dizendo, repetidamente: «só me dão sopa...
só me dão sopa!»
Do livro "Gafanha da Nazaré: 100 anos de vida"
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