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Praia da Barra: Hélio Tavares, um homem bom

Conheci o senhor Hélio Tavares pela sua colaboração regular no “Timoneiro”. Debruçava-se prioritariamente sobre temas regionais, onde não faltava a ria, o moliceiro, a história da região e a vivência religiosa. Era solteiro e catequista, mas distinguia-se pela simplicidade no viver e no falar. Muito sereno e muito ponderado, mostrava-se sempre pronto para ajudar quem precisasse. Morava na Barra, com sua mãe idosa, em casa própria e vivia de rendas no Verão. Era um homem extremamente bom.
Um dia, os seus artigos não apareceram no cartório, como era costume. Considerei que haveria razões para o senhor Hélio se atrasar. E o jornal saiu sem a sua colaboração.Os seus artigos, manuscritos, mostravam uma caligrafia certinha e cuidada. De vez em quando surgia com um poema a condizer.
Vim a saber que o senhor Hélio estava internado no Hospital  Rovisco Pais, na Tocha. Estranhei o facto, mas não o associei à doença da Lepra.


A caminho de Fátima, com minha esposa, para um encontro de formação, resolvi passar por lá para visitar o amigo e assíduo colaborador do “Timoneiro”. À entrada, encontrei um gafanhão que ali exercia funções administrativas, Manuel do Rei. Logo me conduziu até ao quarto do meu amigo Hélio. Estava sentado na cama, a escrever, com livros e muitas folhas de papel espalhadas à sua frente. Preparava mais uns artigos sobre os temas da sua paixão, para publicar na imprensa regional.
Explicou-me, depois, a razão de desejar viver naquele Hospital, na altura com espaços destinados a Lar de Idosos. Ele era idoso, de facto, mas podia muito bem ficar num lar mais próximo. Naquele lar, porém, estava mais isolado, em jeito de retiro. Lia, escrevia, rezava, meditava. E além disso, «gozava do privilégio de ser antigo utente do hospital, por ter a doença de Hansen» — frisou, com a serenidade de sempre. Hansen é o outro nome da Lepra.
Tempos depois, morreu, no silêncio de que gostava. E esquecido de muitos. Também eu não soube do triste desenlace do senhor Hélio, que deixou, entre os que o conheceram, o exemplo de um homem bom, sereno e de fé.

Fernando Martins

In "Gafanha da Nazaré: 100 anos de vida"

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