As causas das migrações são diversíssimas. Desde a fome à guerra, desde a falta de trabalho ao risco da aventura, desde as perseguições políticas aos desafios de familiares e amigos, desde o desejo de cortar com um passado de tristezas e misérias ao sonho de construir um futuro mais risonho para si e para os seus. Tudo serve para justificar ou para optar pela emigração.
Olhando para o século de vida da Gafanha da Nazaré, como freguesia, recordo, por conhecimento director desde a década de quarenta do século passado, altura em que comecei a reter na memória vivências mais consistentes, muitos casos de emigração, uns bem sucedidos e outros nem por isso.
A emigração foi uma realidade em todo país, com fortes implicações na região de Aveiro. E mesmo sem me fixar nos dados estatísticos amplamente estudados, não necessariamente importantes no contexto deste trabalho, importa frisar que os gafanhões também embarcaram no movimento migratório, quer por motivos económicos, que pelo sonho de chegar mais alto.
Familiares meus rumaram aos EUA no princípio do século XX, o mesmo tendo acontecido com vizinhos. E de muitos ouvi falar que lhes seguiram as pisadas. Depois foi o Brasil, Argentina, Venezuela. Mais tarde “emigraram” para Angola e Moçambique. Ainda o Canadá e depois, com grande impacto na região, a França, Luxemburgo e Alemanha, onde presentemente muitos labutam.
O sucesso de bastantes emigrantes foi evidente, com sinais claros nas “maisons” que construíram, carros que exibiram, propriedades que compraram, outra vida que passaram a viver e que legaram aos filhos.
Conheço muitos casos de gafanhões que partiram a “salto” para França. Numa luta de corre e foge, escondidos de dia e caminhando por montes e vales à noite, com temperaturas abafadas nuns dias e geladas noutros, nem todos chegaram ao destino. Os “passadores”, que lucravam com estes serviços, muitas vezes abandonavam à sua sorte, ao menor sinal de perigo, os que deviam conduzir até às fronteiras. Uns emigrantes foram presos e condenados, outros lá chegavam famintos e destroçados.
Em França encontraram a hostilidade de muitos compatriotas, porque o ambiente era do “desenrasque-se quem puder”. Enfrentaram os desafios da legalização, da língua que não dominavam, da ausência da família, dos trabalhos a que não estavam habituados
Anos depois, estabilizados, a vida sorriu-lhes. Mas não a todos, infelizmente.
Reformados ao fim de uma vida dura de trabalho, continuam presos aos países que escolheram para viver. Ali têm os seus .haveres, filhos e netos.
A geração dos descendentes lusos, completamente enraizada no estrangeiro, apenas vem a Portugal, quando vem, para conhecer as origens ou em visita de turismo. A vida continua fora do nosso país.
Fernando Martins
In "Gafanha da Nazaré: 100 anos de Vida"
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