O susto do primo Jorge
«Neste momento, me veio à mente, que vi uma vez o primo Jorge bem zangado. Foi a única vez que o vi assim. Era seu costume, em certos dias de cada mês, ir à Capitania de Aveiro, receber a sua pensão de reforma. Estando ele à espera do autocarro da A.V. Aveirense para o regresso, eis que aparece o Carlos Branco, que lhe ofereceu uma boleia de mota.
O Carlos Branco era um rapaz da Gafanha do Carmo, bem nosso conhecido, até porque tinha sido meu companheiro da tropa, no Regimento de Infantaria 10, em Aveiro; e que ao tempo era o chefe das oficinas de serralharia da JARBA [Junta Autónoma da Ria e Barra de Aveiro]. Era, o que se pode dizer, e sem favor, uma excelente pessoa. Tinha o seu “fraco” pelas motas e era entusiasta das grandes velocidades.
Então o parente Jorge aceitou a boleia. Escarranchou-se na mota, agarrou-se muito bem à cintura do Carlos, e em escassos minutos estavam de chegada. O pior foi que o parente Jorge não ganhou para o susto, que foi tão grande, que mal se sustinha nas pernas e sem cor nem fôlego.
Logo que se recompôs e pôde falar foi para “soltar o gado” ao Carlos, mas de que maneira… O Carlos ouviu e nem uma nem duas. Então, para terminar lhe diz: — Tu nunca mais tenhas o atrevimento, em qualquer parte em que eu esteja, de me oferecer boleia, e oxalá que algum dia não te aconteça o pior, que é o que tem acontecido a muitos abusadores da velocidade como tu. (Pouco tempo antes tinha morrido o Hilário Vinagre de mota).
O velhote Jorge tinha toda a razão, realmente o Carlos abusava da velocidade. Não passou muito tempo, o infeliz Carlos foi vítima da velocidade. Numa reta, na área de Calvão, chocou com uma árvore lateral da estrada e ali encontrou a morte na flor da vida»
António Augusto Afonso
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