quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Um retrato bonito da Gafanha

Imagem que retrata tempos antigos

«A monografia da Freguesia rural de Ovar … contém elementos que explicam certos aspectos da etnografia ilhavense.
O próprio problema do povoamento da Gafanha não pode abstrair desta subordinação a Ovar; só a zona do Sul terá sido mais persistentemente ocupada por colonos de entre Mira e Vagos.
Tenho presentes documentos oficiais que pelo falecido historiador aveirense Marques Gomes me foram oferecidos, relativos ao protesto que os povos do concelho de Vagos levantaram ao aforamento dos areais do Sul pela família Pinto Basto; por um deles (ofício da Câmara de Vagos, de 6 de Junho de 1836, para o Governador Civil do Distrito) se verifica que esta municipalidade considerava os referidos areais “baldios deste concelho desde tempo imemorial”.
Seria de grande curiosidade para a história da região o conhecimento destes e de outros documentos ao assunto referentes; a história da Gafanha é, a bem dizer, de nossos dias, mas já por vezes há dificuldade em esclarecer determinados passos dela; em 1893 publicou-se a “Representação aprovada no comício que em 3 de Abril de 1893 se realizou na cidade de Aveiro com o fim de pedir o estabelecimento de um serviço de dragagem na Ria da mesma cidade”, folheto hoje muito raro, mas precioso para a história da região, e muitíssimo bem escrito; é assinado por Casimiro Barreto Ferraz Sacchetti, Edmundo de Magalhães Machado, e José Maria de Melo Matos, devendo supor-se que os dois últimos signatários tenham sido os seus redatores.
Pode dizer-se que alguns dos problemas vitais da verdejante e linda planície ainda hoje encontrariam a melhor solução nas páginas do esquecido opúsculo, que celebra nos seguintes termos o trabalho persistente profícuo de seus naturais:

… ainda que muitas pessoas se contam neste distrito que viram a Gafanha árida e despida de vegetação, como a maior parte dos areais do litoral, este trabalho foi tão proveitoso que é a Gafanha talvez um dos lugares deste distrito em que haja mais ouro amoedado, sem contar que literalmente fornece sustentação e trabalho a mais de oito mil pessoas sendo, por assim dizer, o celeiro dos concelhos de Aveiro, de Ílhavo, e ainda da maior parte do de Vagos.» 



António Gomes da Rocha Madail
In “Etnografia e História 
— Bases para a Organização 
do Museu Municipal de Ílhavo”
Ílhavo, Tip. Casa Minerva, 1934

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